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Itinerário para os Quatro Jhanas


Por
Ajaan Brahmavamso

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Esta manhã, a palestra será sobre a Concentração Correta, Samma Samadhi, sobre os quatro jhanas, sobre os quais prometi discursar no começo desta semana, sobre exatamente o que são, como obtê-los, para que se possa reconhecê-los quando surgirem e também compreender o seu lugar no esquema das coisas. Se vocês analisarem os ensinamentos do Buda – os Suttas – irão observar que a palavra ‘jhana’ é mencionada com muita, muita freqüência. É um tema comum, que está presente em quase todos os ensinamentos do Buda e que faz parte do caminho óctuplo - Samma Samadhi – Concentração Correta, que é sempre definida como ‘o cultivo dos quatro jhanas.’ Neste retiro de meditação, se formos realmente falar de meditação e se quisermos cultivar a meditação, não há razão porque não deveríamos ter como meta o cultivo dos estados de jhana, porque estes dão à meditação uma profundidade que pode ser experimentada como algo bem especial, e também porque pode-se experimentar o poder e a felicidade desses estados. É essa qualidade de felicidade e poder que mais tarde vocês poderão usar para realmente desenvolver os poderosos insights em relação à natureza das suas mentes e à natureza de todos os fenômenos.

Eu começarei falando sobre a própria história do Buda que está contada nos suttas. Ele alcançou jhana quase que por acaso, quando menino, sentado sob uma árvore jambo-rosa, enquanto observava seu pai realizar uma certa cerimônia. Foi uma experiência muito prazerosa e o que o Buda, ou o Bodisatva, se lembrava era justamente o prazer daquela experiência e um pouco sobre o seu poder. Mas como muitas pessoas, como muitos meditadores, muitos praticantes, ele criou a idéia equivocada de que algo assim tão prazeroso não poderia ter nada a ver com o fim do sofrimento e com a iluminação, que algo assim tão prazeroso deveria ser motivo para mais apego a este mundo. Foi devido a esse tipo de idéia que por seis anos o Buda perambulou pelas florestas da Índia realizando todo tipo de práticas ascéticas. Em outras palavras, quase que buscando o sofrimento, como se por meio do sofrimento ele pudesse encontrar o fim do sofrimento. Foi apenas depois de seis anos de futilidade, e é dessa forma como de fato os Suttas descrevem, que depois de ter se alimentado o Buda se recordou da experiência prazerosa do primeiro jhana quando ainda menino, talvez, ele pensou, “este possa ser o caminho para a iluminação” e o insight surgiu nele, “este é o caminho para a iluminação.” Devido a esse insight, o Buda, como todos sabemos, sentou-se sob a Figueira-dos-Pagodes, desenvolveu os jhanas e com base no poder dos jhanas, na clareza dos jhanas, ele desenvolveu os três conhecimentos verdadeiros: primeiro a recordação das vidas passadas, depois o processo do kamma, a profundidade do kamma, como este direciona os seres para vários renascimentos e por fim as Quatro Nobres Verdades.

Foi só devido ao poder desse estado mental que ele foi capaz de penetrar um nível tão profundamente sutil e descobrir coisas que estavam completamente obscurecidas. Desde então, ele sempre se esforçou por ensinar e encorajar a prática de jhana como um ingrediente essencial do Caminho Óctuplo, um elemento essencial para a iluminação. Se alguém desejar usar o Budismo não só como uma prática perfunctória, mas visando a sua plena realização, tendo como meta a iluminação, então, cedo ou tarde o praticante terá que se deparar com os jhanas, terá que cultivá-los, conhecê-los e usar o seu poder fazendo exatamente o mesmo que o Buda fez e tornar-se plenamente iluminado.

Muitas palestras que os bhikkhus dão, descrevem o problema do sofrimento na vida, relatam as dificuldades da vida e os problemas do renascimento e das muitas mortes; mas eu penso que se vamos falar sobre um problema, é nossa responsabilidade, também, contar a solução relatando-a em todos os seus detalhes, sem omitir nada. Parte dessa solução, uma parte essencial dessa solução, é o desenvolvimento dessas coisas que chamamos de jhana.

Agora, o que na verdade esses jhanas são– eu só falarei sobre os quatro jhanas esta manhã, e irei começar a partir do que poderia ser chamado de plataforma de lançamento do segundo estágio de meditação, ao qual tenho me referido bastante durante as minhas instruções de meditação ao longo deste retiro. O segundo estágio de meditação, no meu esquema das coisas, é aquele em que você tem plena e contínua atenção na respiração. Portanto, a mente não tem qualquer tipo de distração, a cada momento a respiração está presente na mente e esse estado foi estabilizado por meio da atenção plena contínua, até que a respiração esteja continuamente presente na mente, sem distrações por muitos minutos, ininterruptamente. Esse é o segundo estágio nesta meditação e coincide com o terceiro estágio no Anapanasati Sutta em que o meditador experimenta todo o corpo da respiração, sendo que neste caso, corpo é apenas uma palavra para a acumulação de todas as partes de uma inspiração, todas as partes de uma expiração e a sucessiva consciência de todas essas sensações físicas. O estágio seguinte, o terceiro estágio no meu esquema, que corresponde ao quarto estágio no Anapanasati Sutta, é aquele em que, tendo alcançado o segundo estágio e sem deixá-lo ir, isto é, sem abandonar a consciência e a atenção na respiração por nenhum momento, o praticante tranqüiliza e acalma a respiração.

Existem vários modos de fazer isso. Talvez, o mais eficaz seja o simples desenvolvimento de uma atitude de desapego, porque a respiração irá se acalmar naturalmente se você deixá-la por conta própria. No entanto, algumas vezes alguns meditadores têm dificuldade de se desapegar dessa maneira, então, um outro método que pode ser bastante efetivo é o uso da auto-sugestão (*) de calma, calma, calma. Ou da auto-sugestão do desapego, do soltar-se. Há uma grande diferença entre a atitude de desapego e a auto-sugestão do desapego. Ao sugerir o desapego, você na verdade ainda está controlando as coisas, você está envolvido nisso, mas pelo menos o envolvimento está ligado com o direcionamento na direção correta, mandando-o para o lugar onde a atitude de desapego estará acontecendo, sem a necessidade de empregar palavras ou dar ordens, ou instruções. Você está programando a mente na direção correta. Mas eu uso tanto o simples desapego como uma atitude mental, ou a auto-sugestão de calma, calma, calma, sentindo o objeto da atenção, que neste caso é a sensação da respiração, tornando-se cada vez mais refinada, mais sutil. A dificuldade ou o problema neste caso será manter sempre a sua atenção claramente na respiração. Em outras palavras, sem abandonar o segundo estágio enquanto estiver desenvolvendo o terceiro estágio. Mantenha a plena atenção e a consciência da respiração e faça com que a respiração se torne cada vez mais suave, mais e mais sutil, mais e mais refinada, mas sem nunca abandoná-la. À medida que a respiração for ficando mais e mais refinada, a única maneira de não soltá-la é tratando-a de modo muito, muito gentil. Você estará indo na direção de uma atenção na respiração sem esforço, uma consciência da respiração sem esforço, onde a respiração apenas está presente.

Muitos meditadores neste ponto se vêem com um problema, é que eles não se sentem muito seguros quanto à forma correta de perceber a respiração neste estado. Há um tipo de percepção que é apenas percepção, estar plenamente atento, sem dar nomes, sem pensar, sem analisar, um tipo de percepção que não gera pensamentos discursivos. Você tem que se sentir seguro de que está verdadeiramente observando a respiração. Algumas vezes, você poderá não ter a amplitude mental para saber exatamente que tipo de respiração você está observando, mas você saberá que está observando a respiração. A questão é que este é um tipo de percepção que vai se tornando cada vez mais refinada. Nossa percepção usual é muito ampla e cheia de muitos detalhes. Aqui, os detalhes vão diminuindo até chegarmos a um ponto em que teremos tão poucos detalhes que algumas vezes não saberemos verdadeiramente se nós a estamos percebendo, é um tipo distinto de percepção, uma percepção muito mais refinada. Portanto, o discernimento precisa ser muito firme e a confiança precisa ser muito forte, para compreender que ainda estamos com a respiração. A respiração não desapareceu de forma nenhuma e você não precisa, por assim dizer, alargar a amplitude da percepção através da vontade, essa vontade só irá perturbar a mente. Deixe apenas que tudo se acalme. O objeto se acalmará e assim também a percepção começará a se acalmar. É nesse ponto que começa a surgir o nimitta,(sinal), de samadhi. Eu chamo essa parte de terceiro estágio.

Se você tranqüilizar a sensação física da respiração, a sensação mental da respiração começará a surgir - o nimitta de samadhi – em geral, uma luz que surge na mente. No entanto, algumas vezes esse sinal pode parecer uma sensação física. Pode ser uma paz profunda; pode até mesmo ser como um negrume. A descrição desse sinal é bastante ampla simplesmente porque a descrição é aquilo que cada um adiciona a uma experiência que no seu núcleo é uma experiência mental. Quando esta começa a surgir você simplesmente não tem palavras para descrevê-la. E aquilo que adicionamos, em geral, é como nós a entendemos pessoalmente. Negrume, paz, silêncio profundo, vacuidade, uma bela luz ou qualquer outra coisa. Não se preocupe com que tipo específico de nimitta está presente.

Se você quiser aprender como desenvolver esse nimitta, então este quarto estágio, do desenvolvimento dos quatro jhanas, se resume em prestar atenção a este aspecto do nimitta que é belo, que é atraente, que é pleno de felicidade, o seu aspecto prazeroso. E mais uma vez, é neste estágio que você tem que se sentir à vontade com o prazer e não temê-lo, sem temer que ele irá levar a alguma forma de apego, porque em algumas ocasiões o prazer destes estágios pode ser muito intenso, literalmente, avassalador: subjugando a sua noção de ‘eu’, subjugando o seu controle, subjugando a sua sensibilidade em relação ao seu corpo físico. Portanto, você tem que buscar esse prazer e felicidade que se encontram no nimitta, e esse se torna o quarto estágio porque, uma vez que a mente tenha percebido o prazer e felicidade no nimitta, eles atuarão como aquilo que eu chamo de imã ou cola. É isso que irá atrair a atenção, não é a vontade ou escolha, ou decisão, que irá tomar a atenção e colocá-la no nimitta de samadhi. Na verdade, sempre que a escolha, a intenção, os comandos surgirem dentro de você, eles efetivamente o afastarão desse estágio. Você tem que deixar que todo o processo opere, porque neste estágio o nimitta de samadhi é muito prazeroso; ele literalmente puxa a mente para si. Muitos meditadores quando experimentam jhana pela primeira vez, sentem a mente como que caindo num buraco que é belo. E isso é exatamente o que acontece. É a alegria, a felicidade, a beleza desse nimitta que está diante da mente, que na verdade puxam a mente para si. Portanto, você não precisa empurrar, você não tem que fazer esforço. Neste estágio, isso se torna um processo natural da mente. A sua tarefa é só alcançar aquele segundo estágio, acalmar a respiração, permitindo que o nimitta de samadhi surja. Uma vez que o nimitta de samadhi tenha surgido com força, então o jhana ocorrerá por si mesmo.

Outra vez, visto que a qualidade da percepção é muito intensa, porém muito estreita nestes estados, enquanto você estiver nesses estados, não lhe será possível determinar exatamente onde você se encontra e o que está acontecendo. A habilidade de compreender através do raciocínio e da análise é retirada da pessoa nestes estados. Em geral, você tem que esperar até emergir desses estados para que o seu processo de raciocínio normal regresse novamente, para que você possa olhar e analisar aquilo que aconteceu. Qualquer desses estados de jhana é uma experiência poderosa e como tal deixa uma marca profunda na sua mente.

Infelizmente, não há uma palavra que corresponda a um trauma positivo. A palavra ‘trauma’ equivale a uma forte experiência negativa, uma experiência dolorosa que deixará marcas. Os estados de jhana são similares a um trauma em força e resultado, e você se lembrará deles com clareza porque causam um forte impacto na sua memória. No entanto, são experiências puramente prazerosas, como um trauma prazeroso e como tal, você poderá se recordar delas com facilidade. Assim, depois de emergir de um jhana, geralmente não há nenhum problema em olhar para aquela experiência e perguntar, “o que foi isso?” e de ser capaz de enxergar com clareza o tipo de experiência, o objeto, do qual você esteve consciente durante todo o tempo e que poderá então ser analisado. É neste ponto que você pode descobrir exatamente onde esteve e o que aconteceu, mas durante o jhana você não é capaz de fazer isso.

Depois do jhana, ele pode ser reconhecido por aquilo que o Buda chamava de ‘os fatores de jhana.’ Esses são os principais indicadores que lhe dizem em quais estados você esteve especificamente. É bom conhecer esses indicadores, mas lembre-se, eles são apenas indicadores desses estados, eles são as principais características desses estados e no primeiro jhana existem muitos aspectos secundários. Na verdade, o primeiro jhana é bastante amplo. No entanto, se for uma experiência de primeiro jhana tem que ter as cinco características principais, os cinco principais fatores de jhana. O segundo jhana é muito mais estreito, mais fácil de identificar se foi esse o estado em que você esteve. O mesmo ocorre com o terceiro e quarto jhanas, estes são ainda mais estreitos. A amplitude da descrição dessa experiência, que você poderá dar, irá se estreitar à medida que você alcançar níveis mais profundos de desapego.

Mas para o primeiro jhana, o Buda indicou cinco fatores. Os principais fatores são a dupla piti-sukka. Isto é, a felicidade. Pode ser que, se você pesquisar nos livros o significado desses termos, eles tentem tratá-los como fatores separados. Eles são coisas distintas, mas nos dois primeiros jhanas piti e sukha estão entrelaçados de modo tão próximo que você não será capaz de distinguir um do outro, e será mais produtivo não tentar e sim encarar esses dois fatores apenas como ‘felicidade.’ Esta é a descrição mais precisa que a maioria das pessoas poderá reconhecer: “Isto é felicidade.” O Buda chamava isso de vivekaja piti-sukka, aquele tipo particular de felicidade que provém do desapego, provém do distanciamento, provém do isolamento. Viveka é a palavra para ‘isolamento,’ ‘distanciamento,’ ‘separação,’ e significa ‘separado do mundo dos cinco sentidos.’ É disso que você se separou e é essa a felicidade surgida dessa separação, que é, por sua vez, a causa dessa felicidade e gozo. E esse tipo de felicidade possui um sabor peculiar que não é compartilhado por outros tipos de felicidade, é a felicidade do isolamento. É por isso que algumas vezes também é chamada de a felicidade da renúncia. Você renunciou aquelas coisas, por conseguinte, está separado delas.

Existem outros dois fatores que com freqüência confundem as pessoas. Estes são os dois termos ‘vitakka’ e ‘vicara’ – que têm sido traduzidos como ‘pensamento aplicado’ e ‘pensamento sustentado.’ No entanto, deve ser observado que o pensamento, tal qual você normalmente o percebe, não está presente nos jhanas de forma nenhuma. Aquilo que chamamos de pensamento foi completamente apaziguado. Estes dois termos se referem a um último vestígio de movimento na mente que, se fosse continuado, iria dar origem ao pensamento. É aproximadamente aquilo que poderia ser chamado de pensamento subverbal. É um movimento da mente em direção ao objeto de meditação. Isso é chamado de vitakka. Mas tem de se apresentar num nível subverbal, como um movimento, como uma intenção apenas, sem que a mente irrompa em palavras e rótulos.

A mente se move na direção do objeto, e lembre-se que agora o ‘objeto’, aquilo para o que você está dirigindo a atenção, é piti-sukha. Essa é a razão pela qual esse é o principal fator deste jhana, porque você está consciente da felicidade. Esse é o objeto da sua meditação e não a respiração o corpo ou qualquer palavra, pois você tem consciência da felicidade. E você também terá consciência, e esta é uma das características do primeiro jhana, de que a mente ainda está vacilando um pouco. A felicidade, que é o objeto da sua atenção, parecerá esvair-se ou retroceder e à medida que ela se esvai, que retrocede e que perde força, a mente irá em busca dela novamente. Como se estivesse atraída pelo seu poder, pelo seu gozo, a mente vai em busca dela; isso é chamado de ‘vitakka,’ o movimento da mente em direção ao seu objeto. Ao alcançar o objeto, a mente irá agarrá-lo e isso é chamado de ‘vicara,’ que é um esforço mental, mas um esforço mental sutil. Esse é um esforço da mente e não um esforço proveniente da vontade. Não é um esforço provindo de você, é a mente agindo por si mesma. Ao longo de todo o processo você é um observador passivo de tudo isso. E tendo agarrado o objeto, depois de algum tempo, ela perderá a força e retrocederá daquele objeto novamente. Dessa forma, o objeto parecerá estar vacilando, sem estar verdadeiramente firme. Em vista disso, a mente parecerá ter uma pequena amplitude, sem estar realmente firme. Portanto, essa amplitude é muito limitada e você não deve se afastar dessa felicidade em nenhum momento, pois assim que você se afastar dela ainda que só um pouco, ela retrocederá e imediatamente atrairá a mente de volta novamente.

Como a amplitude é muito limitada isto é chamado de unicidade da mente: toda a energia, o foco da mente está em um só ponto, tanto no que se refere ao espaço como ao tempo. Esta experiência não se modifica durante muitos, muitos, muitos minutos num primeiro jhana completo. Essa experiência é mantida exclusivamente através do movimento da mente indo em direção daquela felicidade e essa felicidade tendo uma longa duração. Mais uma vez, assim é como você verá a experiência, mas só depois de emergir de jhana. Você não será capaz de analisar a experiência composta de cinco fatores enquanto a experiência estiver ocorrendo porque a mente não terá a amplitude, a habilidade para pensar, a habilidade para analisar, enquanto você estiver nesse estado. Enquanto você estiver nesse estado, a única coisa da qual você estará consciente é dessa felicidade. Na verdade, você estará tomado pela felicidade, sem saber exatamente a razão ou o que está acontecendo, mas sentindo um tipo de sensação ou confiança de que isso vale a pena, que isso é belo, que isso é profundo, que vale a pena ser feito, de modo que você pode continuar nesses estados.

Em geral, a primeira experiência de jhana é o primeiro jhana. Depois de algum tempo, a força de samadhi, aquilo que você trouxe consigo para aquele estado, começará a declinar e a mente irá se afastar da felicidade, e vitakka não será forte o suficiente para trazê-la de volta novamente e assim você irá emergir do jhana. O jhana se dissolverá e você será capaz de pensar e analisar novamente. Os pensamentos surgirão na mente e isso será provavelmente uma das primeiras coisas que irá surgir depois da dissolução do jhana. A mente ainda conterá muita felicidade e gozo, mas não terá mais a unicidade. O corpo em geral não será identificado no início e só mais tarde a mente desejará ver e observar o que esteve ocorrendo com o corpo durante todo esse tempo.

A mente estará muito poderosa neste estágio. No momento em que tiver emergido de jhana, você ainda desfrutará de muita felicidade e gozo, e nas palavras do Buda, a sua mente estará ‘maleável,’ a sua mente estará ‘trabalhável.’ Será como um pedaço de argila, que não está nem muito molhada nem seca em demasia, que poderá ser facilmente convertida em qualquer formato que você desejar devido ao poder que você investiu na mente, e essa se torna a experiência do primeiro jhana. Uma vez que você tenha experimentado isso pela primeira vez, é bom identificar o que fez com que aquele jhana surgisse. O que você fez? Ou melhor dizendo, o que foi que você abandonou e que causou o surgimento do jhana? Ao invés de o que você fez, aquilo que você abandonou se torna um indicador muito mais poderoso dos caminhos para alcançar esses estados. Em geral, você se dá conta de que desenvolveu esse segundo estágio ao começar a se soltar do ‘controlador,’ ao abandonar a mente vagante, ao abandonar o temor desses estados, e especialmente, ao abandonar o controlador e permitir que a mente mostre a sua cara quando você não está presente dando todos os comandos. E quando você começar a compreender isso e começar a aprender os caminhos para alcançar esses jhanas, você deverá fazer um esforço para começar a desenvolvê-los, repetí-los com freqüência, pois você não só estará desenvolvendo o insight, como também a habilidade de abandonar aquelas coisas que são o motivo de profundos apegos.

À medida que você for desenvolvendo cada vez mais esses jhanas, eles se tornarão estados muito agradáveis de serem desenvolvidos. Algumas pessoas imaginam que a vida santa, uma prática espiritual, deve ser austera e severa. Se você quiser fazer com que ela seja austera e severa, isso é com você, mas se você quiser trilhar um caminho alegre, um caminho de felicidade, que ao mesmo tempo conduzirá à iluminação, este é o processo. Muito embora estes prazeres sejam muito intensos, prazeres mentais, o Buda disse que eles não devem ser temidos. Ele disse isso em muitos Suttas, e num deles, no Digha Nikaya, ele disse aos bhikkhus: se uma pessoa desenvolver estes jhanas, se os tiver em grande estima, estiver quase apegado a eles, apegado ao seu desenvolvimento, então há quatro conseqüências do apego a esse desenvolvimento. A palavra que estou traduzindo como apego é anuyoga. A palavra ‘jugo’, (em inglês ‘yoke’), provém da palavra ‘yoga’ que significa ‘atado a’. Anu significa ‘junto com,’ então anuyoga equivale a ‘atado junto com,’ portanto, literalmente, o significado é ‘praticar com freqüência,’ repetindo outra vez, outra vez e outra vez, o que algumas pessoas interpretariam como ‘estar apegado a.’

Portanto, existem quatro resultados dessa prática de jhanas, não são cinco resultados, nem três resultados, mas quatro resultados. E esses quatro resultados da prática repetida dos jhanas, outra vez, outra vez e outra vez, são: entrar na correnteza, retornar uma vez, não retornar e Arahant. O Buda expressou isso de forma inequívoca. Os jhanas não levam a um maior apego pelo mundo, eles na verdade conduzem a experiências de iluminação, à separação do mundo. O caminho para desenvolvê-los é este: à medida que o primeiro jhana for ficando mais e mais desenvolvido, você poderá ter como meta os jhanas mais elevados. A única forma de apontar para os jhanas mais elevados é fazer isso antes de entrar nessa área mental que chamamos de mundo dos jhanas. Porque uma vez que você estiver em algum dos jhanas, você estará preso ali e não poderá dar quaisquer ordens ou comandos, você não poderá dirigir a sua mente quando esta estiver em qualquer uma dessas absorções. O ato de objetivar, dirigir, dar instruções, tem que ser feito de antemão.

É muito difícil encontrar símiles para isso. Um símile fraco, mas que já usei antes, é como se alguém se precipitasse na direção de uma casa que tem quatro cômodos sendo que o quarto cômodo se encontra bem ao fundo, o terceiro um pouco antes deste, o segundo cômodo um pouco antes do terceiro e o primeiro logo depois da porta. O piso é feito de uma camada muito, muito escorregadia de gelo, de modo que você não consegue obter nenhuma impulsão uma vez que tenha passado a porta de entrada. Todo o seu momentum tem que ser criado do lado de fora, para que ao atacar a porta, se você estiver indo muito rápido, poderá escorregar do primeiro cômodo para o segundo cômodo. E se você estiver indo realmente muito rápido poderá até mesmo alcançar o terceiro cômodo e se estiver indo realmente muito, muito rápido no momento em que passar pela porta, poderá escorregar toda a extensão até o quarto cômodo. Mas uma vez que você esteja em qualquer um desses cômodos, você não poderá aumentar o impulso. Portanto, a única forma de alcançar esses jhanas mais profundos é, antes de entrar em qualquer um desses estados, assegurar-se de que os seus esforços para se soltar, que a sua determinação de abandonar, que o seu desejo de acalmar todas as perturbações seja tão forte que você consiga acalmar as perturbações dessa mente ativa, e em seguida consiga estabilizar vitakka-vicara e muitas outras coisas também. A mente se acalma, uma coisa após a outra à medida que ela vai penetrando os jhanas mais profundos.

O segundo jhana é o primeiro verdadeiro estado de samadhi, porque neste estado você acalmou as perturbações do primeiro jhana, a vacilação da mente, vittaka-vicara foram abandonados. Portanto, agora a mente está firmemente unificada com o objeto que é a felicidade, e este estado é um samadhi firme como a rocha, onde existe apenas um objeto na mente, a felicidade, e não resta qualquer espaço na mente. A mente está totalmente unificada num ponto, firme e sólida como uma rocha e dominada pela felicidade, portanto, o objeto não se move de forma nenhuma, ele está ali presente um momento após o outro e após o outro e após o outro. Devido à solidez e estabilidade desse estado, o segundo jhana irá durar muito mais, será mais longo do que o primeiro jhana; os jhanas mais profundos durarão mais tempo e no caso do segundo jhana, estamos falando de horas, simplesmente porque é um estado muito firme. Enquanto o primeiro jhana pode estar presente por alguns minutos, um bom segundo jhana deveria ser muito longo – e muito firme. Uma vez nesse estado, não há modo de sair até que a energia daquele jhana tenha sido consumida. Essa é a única forma, pois você não pode tomar a decisão, “agora é hora de sair disto.” Se alguém chamá-lo, você simplesmente não o ouvirá, se alguém tocar no seu ombro, você não sentirá nada, porque você estará completamente isolado do mundo externo. Você, literalmente, estará exatamente no centro da sua mente e não poderá ser contactado. Outra vez, esse segundo jhana, uma vez que comece a se dissipar, irá se dissipar para um estado que equivale ao primeiro jhana e depois se dissipará com o pensamento discursivo. E aí você terá saído do estado de jhana.

Para aqueles que querem explorar esses estados com freqüência, uma coisa importante que pode ser feita é, ao invés de deixar que o momentum da sua energia acalme a energia de samadhi, tomar a decisão antes de entrar nesses estados. Você apenas precisa dizer para si mesmo, “Eu entrarei em jhana por meia hora ou por uma hora.” Como a mente estará muito purificada nesses estados ela terá poder, a sua decisão funcionará como uma programação de computador, e uma vez que o tempo tenha passado, a mente deixará os jhanas. Eu não posso explicar exatamente como isso funciona, mas funciona. Do mesmo modo você pode ir dormir e dizer, “Eu irei despertar às três horas” e você se despertará às três horas, com uma variação de talvez uns cinco minutos, sem o uso de um alarme. A mente, se você programá-la com atenção plena, responderá. Portanto, esse é um método muito útil e essa é uma boa instrução; empregar essas decisões para que você não gaste um tempo demasiado longo nesses estados, se você tiver outras coisas que fazer ou algum compromisso. Primeiro de tudo tome uma decisão. De qualquer maneira, quando você estiver nos jhanas, você não poderá tomar uma decisão, não poderá pensar e não poderá fazer análise. A única coisa da qual você terá consciência é de estar tomado pela felicidade, você não terá muita certeza do que está acontecendo e só depois que você tiver a oportunidade de emergir é que poderá analisar e ver o que aconteceu e porque aconteceu.

Se uma pessoa quiser se aprofundar nos jhanas, então neste ponto, é necessário compreender que aquela felicidade que compõe o segundo jhana, proveniente de samadhi, nascida da completa unificação da mente, uma felicidade com um sabor distinto, possui um aspecto que ainda perturba a mente, e esse é o aspecto de piti. É quase como uma excitação mental e que pode ser superada se a pessoa tomar como meta acalmar esse aspecto.

 

Source : http://www.acessoaoinsight.net

 
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